José Claudio Pereira
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Eonara do Carmo Cesa Paim
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A harmonia que não queremos
Assim, em nome da harmonia e do bom clima interno, evita-se a exposição de projetos, ideias, estratégias e inovações que possam contrariar ou causar desconforto às pessoas ou áreas da empresa.
Vivemos em busca de harmonia, de um ambiente de entendimento entre as pessoas, nada mais natural para se almejar. Porém, é importante refletir como essa estabilidade é conquistada e quais suas consequências, principalmente no ambiente corporativo. Ocorre que, em algumas organizações, o equilíbrio sustenta-se no desinteresse do debate e oposição de ideias, sob o argumento de que o contraponto gera desarmonia. Assim, em nome da harmonia e do bom clima interno, evita-se a exposição de projetos, ideias, estratégias e inovações que possam contrariar ou causar desconforto às pessoas ou áreas da empresa. É aí que mora o perigo! Isto por que o ambiente cordial que ela exige impõe neutralidade, sufocando a troca de ideais e posicionamentos individuais capazes de questionar verdades e inverdades arraigadas.
“Viver é como andar de bicicleta: é preciso estar em constante movimento para manter o equilíbrio”. A partir deste pensamento de Albert Einstein, podemos iniciar uma reflexão sobre o preço pago por uma empresa na qual a diplomacia e a cordialidade entre seus membros vêm em primeiro lugar. O que nos diz o mestre cientista de maneira simples e ao mesmo tempo profunda? Que o equilíbrio estático, imutável e inabalável nos leva à queda, à estagnação. Que, para não nos perdermos, precisamos nos mover e perder o equilíbrio momentaneamente.
Outro pensamento que pode ajudar-nos pertence ao trecho de uma música contemporânea e popular entre os jovens: “Paz sem voz não é paz, é medo”, do grupo Rappa. Além de traduzir o caráter autoritário da “harmonia muda”, a frase permite-nos transpor a ideia para a questão do respeito propalado como um valor de empresas do tipo “equilíbrio total”, ou seja, respeito sem troca de ideias não é respeito, é comodismo velado, é neutralidade que anula o conflito de opiniões e o debate, sacrificando o direito de cada um defender seus posicionamentos.
Nesse cenário, não é possível construir o novo para vivê-lo enquanto dure, pois, em breve, poderá ser substituído por outra inovação, seguindo o movimento do equilíbrio. A construção não acontece porque não há desconstrução, uma vez que os problemas reais da empresa estão camuflados na prática inconsciente da cordialidade muda e surda do dia a dia.
Uma organização não é um templo harmonioso e blindado contra as divergências. É um organismo vivo e dinâmico, cujos princípios, políticas e práticas precisam ser desconstruídos pelos questionamentos e contrapontos. Enfim, qualquer empresa precisa de conflito positivo, aquele que, administrado pelas lideranças, é capaz de emergir problemas e soluções, de desconstruir para construir.
Vale finalizar esta breve reflexão com uma frase de Heráclito, que rompe com o medo do conflito: “Da discórdia surge a mais bela harmonia.”