José Claudio Pereira
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Eonara do Carmo Cesa Paim
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Crédito mais caro: famílias e empresas pagam juro mais alto desde 2017
Para pessoas físicas, taxa média alcançou 58,3% ao ano em fevereiro, alta de 10 pontos percentuais em 12 meses
O aperto do crédito provocado pelo Banco Central chega com cada vez mais força às famílias e empresas brasileiras. Nesta terça-feira (29), o BC divulgou que a taxa média de juros do chamado crédito livre, que são as linhas sem subsídios, subiu para 44,23% ao ano em fevereiro. Trata-se do maior patamar desde agosto de 2017, quando alcançou 45,59%.
No cheque especial, houve um forte aumento de janeiro para fevereiro: de 131,1% para 137,4%. O mesmo efeito aconteceu com o rotativo do cartão de crédito, que saltou de 411,4% para 417,4%.
Essas são linhas consideradas emergenciais, usadas pelas famílias em momentos de descontrole de gastos ou quando não conseguem tomar empréstimos de linhas mais baratas, como as do crédito consignado, que ficaram estáveis em 26,7%. Nos juros cobrados das empresas, o rotativo do cartão de crédito também teve forte alta, de 182,4% para 221,3%.
— Isso é resultado do momento econômico que estamos vivendo. Temos a Selic (taxa básica de juros) no patamar elevado de 13,75%, e o Banco Central sinalizando que vai manter por algum tempo essa taxa elevada, mesmo com a pressão do governo (para a queda dos juros) — avalia Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor-executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).
Bola de neve
Um dos efeitos negativos dos juros elevados, porém, é o endividamento das famílias com bancos e instituições financeiras. Até janeiro de 2023, o nível de endividados estava em 48,8%, alta de 1 ponto percentual em 12 meses, segundo dados do BC.
— Vivemos o maior nível de juro desde 2015/2016, quando a Selic atingiu 14,25% ao ano. Existem famílias e empresas que não têm outra opção para sobreviver, elas precisam recorrer aos empréstimos bancários ou tomar crédito no mercado e capitais, no caso das empresas. Neste momento, está saindo bastante caro com o nível em que a Selic está — pontua Walter Fogolin, economista e gerente de Produtos da InvestSmart da XP.
Luana Nascimento, de 29 anos, é técnica de enfermagem, mas parou de trabalhar após engravidar. Sempre preocupada em pagar as contas em dia, a moradora de Queimados, na Baixada Fluminense, viu seu nome ficar negativado após o marido perder o emprego. O dinheiro que usava para quitar a fatura do cartão de crédito teve que ir para despesas mais urgentes.
— Eu tinha dois cartões. Optei por deixar de pagar um e fiquei apenas com o outro. Hoje, virou uma bola de neve que chuto todo mês — revela.
Segundo os dados divulgados ontem, o volume total de crédito concedido em fevereiro foi de R$ 421,8 bilhões. Houve um aumento de R$ 21,2 bilhões em relação ao mesmo mês do ano passado. Os números, contudo, indicam uma desaceleração: o aumento de fevereiro de 2021 ante o mesmo mês de 2022 foi de R$ 87,7 bilhões.
— A partir do segundo semestre tem uma desaceleração do crédito. Isso significa que o crédito continua crescendo, porém em volumes menores. O segundo semestre do ano passado foi um momento de desaceleração da atividade econômica como um todo. O ciclo de aperto contribui para a desaceleração do crédito — diz o chefe do Departamento de Estatísticas do BC, Fernando Rocha.
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Queda na oferta
Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), argumenta que os dados do BC atestam “claramente” que o ciclo de “queda na oferta e da demanda de crédito foi acentuado”:
— As razões são muitas. Há a inflação elevada; o efeito do forte aperto monetário; um fim das antecipações de caixa, fundo de garantia, 13º e todos os outros incentivos (ao consumo) do período eleitoral que foram esgotados; um endividamento elevado que limita a capacidade de absorção de crédito etc.
Paulo Roberto Vieira, de 33 anos, aproveitou o último Feirão Limpa Nome do Serasa para quitar suas dívidas, que somavam cerca de R$ 9 mil. Vendedor de carros em São Vicente, no litoral paulista, seus principais credores eram companhias de telefone e bancos.
— Meu ramo passou e passa por uma instabilidade muito grande. Na época em que contraí as dívidas, as vendas estavam muito fracas. Daí foi acumulando, acumulando, e não consegui pagar — comenta.
Segundo Vieira, com os descontos oferecidos no Feirão — algumas deduções chegaram a 92% — os R$ 9 mil saíram por cerca de R$ 1 mil.