José Claudio Pereira
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Eonara do Carmo Cesa Paim
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Os prós e os contras da semana de quatro dias no Brasil
Embora seja verdade que algumas organizações já tenham experimentado – e adotado em definitivo – o modelo, ainda são poucas as empresas que resolveram arriscar a nova dinâmica.
Tendência que vem se afirmando em alguns países ao redor do mundo, como Bélgica e Emirados Árabes Unidos, a semana de quatro dias chega para ser testada no Brasil. Embora seja verdade que algumas organizações já tenham experimentado – e adotado em definitivo – o modelo, ainda são poucas as empresas que resolveram arriscar a nova dinâmica. O cenário, porém, pode mudar.
Na última semana, a ONG 4 Day Week Global e a Universidade de Boston, em parceria com a empresa brasileira Reconnect Happiness at Work, anunciaram um plano de ação para negócios locais testarem a novidade. As companhias dispostas a encarar a novidade devem preencher um formulário e as inscrições têm prazo até agosto.
A dinâmica chega ao país pouco tempo após o Reino Unido aprovar a jornada de quatro dias. As empresas participantes serão preparadas durante o mês de setembro com estudos e treinamentos sobre a metodologia. Passada a etapa de orientações, o período de implementação da semana reduzida terá início em novembro deste ano e final em maio de 2024.
Uma das condições estabelecidas é para que, mesmo com a redução de 20% da jornada semanal de trabalho, as companhias não façam alterações no salário. Ou seja, ele não será reduzido junto à carga horária.
O modelo funciona?
Alguns estudos trazem resultados positivos sobre a modalidade. Um deles é um relatório divulgado em novembro do ano passado por pesquisadores das Universidades de Boston, de Dublin e de Cambridge. Empresas dos Estados Unidos e da Irlanda passaram por uma etapa de experimentação e foi identificado aumento de 8% nas receitas.
Além disso, de acordo com o estudo, o dia a menos de trabalho fez com que diminuíssem os índices de sobrecarga e de licenças por questões médicas ou pessoais. “Os resultados são impressionantes”, afirmou Juliet Schor, uma das professoras representantes da Universidade de Boston no projeto.
Outra análise, desta vez da organização de pesquisas Autonomy em conjunto com a 4 Day Week Global, teve resultados igualmente positivos. 61 empresas do Reino Unido passaram pelo teste e relataram que a produtividade, na maioria dos casos, se manteve a mesma ou subiu. De quebra, a qualidade de vida aumentou e a intenção de deixar o atual emprego teve queda de 92%.
Dentre as 61 empresas que participaram da pesquisa, 18 afirmaram que manteriam o modelo de semana de trabalho de quatro dias permanentemente e as demais afirmaram que continuariam com a mudança temporariamente.
Testes já começaram
No Brasil, empresas que implementaram a semana de quatro dias também já notaram mudanças na rotina. Um exemplo é a Vockan, representante exclusiva da QAD no Brasil e que desenvolve ERP e soluções para a indústria de manufatura. Uma pesquisa interna revela que não somente a satisfação dos colaboradores aumentou – partindo de 54% para 70% –, como a qualidade de vida também teve impacto positivo – de 57% para 86%.
O programa, que teve início em novembro de 2022, também trouxe aumento de 43% no índice de felicidade e crescimento de 23% na produtividade. O projeto da semana de 4 dias nasceu a partir do desejo da liderança da Vockan, que implementou, desenvolveu e criou suas próprias metodologias. Logo após a implantação da jornada de quatro dias de trabalho, a companhia se filiou à 4 Day Week Global.
“A produtividade permaneceu alta com um aumento no bem-estar da equipe, foco do trabalho e comprometimento, mantendo o alto nível de entregas para os clientes. Os funcionários relataram uma variedade de benefícios relacionados à qualidade de vida, níveis de estresse, vida pessoal e saúde mental. Somos uma companhia jovem, recém-lançada no mercado, mas com vasta experiência no segmento de tecnologia. Por isso, sabemos da importância de um ambiente corporativo que prioriza a flexibilidade e valoriza o equilíbrio entre vida pessoal e profissional”, destaca Fabrício Oliveira, CEO da empresa.
Fabrício Oliveira, CEO da Vockan
O sistema de trabalho na Vockan é híbrido, sendo recomendável um dia na semana no formato presencial para integração dos times. Para a equipe de Suporte que já aderiu à semana de quatro dias, os finais de semana podem ser prolongados, podendo escolher entre a sexta-feira ou a segunda-feira como dia de descanso.
Vantagens e desvantagens
Segundo Gustavo Medeiros, especialista em neurolinguística, a tendência natural da jornada reduzida é que os resultados sejam benéficos tanto para as empresas quanto para os colaboradores. No entanto, por mais que a ideia seja promissora, é fundamental que a implementação seja planejada e estratégica.
“Reduzir a jornada de trabalho semanal para quatro dias pode contribuir para melhorar a qualidade de vida e produtividade dos colaboradores por possibilitar uma melhor divisão entre vida pessoal e profissional, mas esse novo cenário exige uma melhor organização para ser realmente benéfico. O trabalho realizado anteriormente em cinco dias é condensado em apenas quatro, o que exige um trabalho envolvendo metas e atividades muito bem definidas, caso tudo seja feito corretamente, a redução pode ser bastante positiva”, elucida.
Professor e diretor da Faculdade CENBRAP, o médico Marcos Mendanha ressalta que a redução da carga horária semanal de trabalho resulta em mais energia, disposição, produtividade e bem-estar. Porém, ele deixa claro que não basta reduzir um dia de trabalho e manter a mesma carga horária total de cinco ou mais dias. É um fator ao qual as empresas precisam se policiar.
“Se a carga semanal estava distribuída para cinco dias e se reduz a jornada de trabalho para 4 dias, mantendo-se a carga de trabalho original, a conta não fecha. O trabalhador, nesse caso, terá que fazer tudo que fazia em cinco dias, agora em quatro dias. Isso gera sobrecarga de trabalho, um dos fatores que mais promovem Burnout e adoecimentos mentais no contexto ocupacional”, afirma.
O ponto trazido pelo especialista é corroborado pelo consultor de RH, Luiz Cabral. Em sua visão, por mais que os estudos tenham resultados empolgantes, o Brasil tem uma cultura de excesso de trabalho muito predominante – o que o faz ser, por exemplo, a segunda nação com mais casos de Burnout. Sendo assim, empresas que se descuidarem no processo de adaptação podem transformar a jornada de quatro dias ainda mais cansativa do que a padrão.
Outro aspecto de atenção trazido pelo consultor diz respeito às lideranças. Líderes despreparados podem aumentar a cobrança em cima dos colaboradores, principalmente quando a empresa não trabalhar com bons mecanismos de mapeamento da produtividade.
“A redução pode pressionar os líderes, especialmente se a mudança de jornada trouxer consigo algum impacto financeiro negativo, o que tende a ocorrer com quem realizar a mudança por modismo e não por estratégia. É um grande processo de adaptação que exige preparo de todos os setores da empresa”, finaliza.